sábado, 20 de setembro de 2025

O voluntarismo teológico



Por D. Rubén Calderón Bouchet

Não temos um conhecimento intuitivo de Deus e, como a abstração supõe intuições prévias, há poucas probabilidades de um saber metafísico natural. Nesta ocasião, como em muitas outras, o recurso à vontade divina permite a Ockham remediar nossa incurável pobreza especulativa e salvar, ao menos em aparência, as verdades reveladas.

O curioso é o seguinte: se não há intuição de Deus, nem tampouco um conhecimento abstrato, como conhecemos a Sua vontade?

Ockham responde: pela fé infundida pelo próprio Deus para aceitar Sua vontade. É vontade do Senhor que O conheçamos abstratamente, uma vez omitida a via intuitiva, que poderia garantir naturalmente tal conhecimento.

Deus todo-poderoso faz o que quer e, em certa medida, faz tudo o que Ockham necessita para fornecer à alma humana uma noção referente à Sua realidade metafísica. Essa noção não admite provas: "non potest sciri evidenter quod Deus est" (não se pode saber evidentemente que Deus existe). A existência de Deus é objeto de fé; a razão é impotente para conhecer algo da realidade divina. Conhecemos, pela fé, os efeitos de Sua onipotência, mas nada pode nos dizer a inteligência natural sobre a essência mesma de Deus.

O caminho do ceticismo metafísico está inaugurado e, com ele, a ampla avenida do fideísmo religioso. Uma fé sem inteligência deixa para a razão apenas o conhecimento do mundo. Um mundo sem saber teológico se converterá no campo natural da libido dominandi (o desejo de dominar).


Fonte: Rubén Calderón Bouchet, Decadência da Cidade Cristã, cap. IV, “A Filosofia Política na Universidade do Século XIV”, pp. 148.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

O voluntarismo teológico

Por D. Rubén Calderón Bouchet Não temos um conhecimento intuitivo de Deus e, como a abstração supõe intuições prévias, há poucas probabilida...